Em tempos de crise, o direito da insolvência ganha bastante relevo, na medida em que apresenta inúmeras medidas mitigadoras e alternativas para a superação do período de recessão econômica.

Para as empresas que visualizam a inevitabilidade de adoção do procedimento da recuperação judicial, por conta da necessidade de adoção de medidas eletivas para administração de caixa, e, principalmente, para aquelas que poderão fechar suas portas em razão da concretização de eminentes penhoras e constrições legais, há possibilidade de apresentação de um pedido de tutela de urgência antecedente, a fim de que sejam suspensas as medidas constritivas, ações e execuções que possam prejudicar o andamento da empresa durante o período de preparação para o pedido de recuperação.

Vale ressaltar que o período que precede o pedido de recuperação pode ser bastante extenso, considerando a necessidade de realizar um acervo de documentos e estudos contábeis, razão pela qual a medida judicial proposta pode contribuir para a continuidade das atividades da empresa, sem nenhum transtorno.

Essa medida presente em nosso ordenamento possui como escopo antecipar os efeitos do stay period, caracterizado como período subsequente ao deferimento da recuperação judicial e que possui o objetivo de conceder um fôlego à empresa para que possa viabilizar a aprovação do plano de recuperação pelos credores.

Por conta disso, foram proferidas decisões importantes reconhecendo a possibilidade de antecipar os efeitos do stay period para que a empresa possa se preparar e apresentar seu requerimento de recuperação judicial, sem que ocorram medidas constritivas ou ações que possam desestabilizar economicamente sua atividade, preservando a sua função social.

É importante citar uma das decisões proferidas em âmbito nacional sobre a possibilidade de antecipação dos efeitos do stay period em tempos de crise, enfatizando a necessidade de manter as atividades da empresa para evitar consequências reflexas, cabendo destacar a decisão proferida pelo Juízo da 2º Vara da Comarca de Balsas-MA, que assim se manifestou:

Em verdade, registra-se que há uma colisão de valores e direitos dos credores e devedores, porquanto, de um lado, há temporária suspensão dos direitos dos credores, merecedores de tais direitos pelos contratos entabulados e pelas normas relacionadas à força vinculante a eles conferida, de outro há que se ater às normas orientadoras da aplicação do direito como a função social, a já mencionada proteção à livre iniciativa, dentre outros reflexos que o encerramento da produção acarretaria, como diminuição de receitas fiscais, extinção de vagas de emprego e queda no desenvolvimento econômico da região, que entendo que deve preponderar por ser um dos ditames da justiça elencados no art. 170 e erigidos como fundamentos da República pelo art. 1º, III, todos da Carta Social.

Em que pese a essencialidade dos bens a serem constritos exigir apurada análise da cadeia de produção e da situação patrimonial, entre outros fatores, sendo competência exclusiva do juízo da recuperação, as alegações dos requerentes permitem concluir que a não proteção dos grãos poderá prejudicar o pedido de recuperação, razão pela qual, por cautela, pertinente a preservação de tais bens para garantir o resultado útil do processo, o que se afigura possível em decorrência da abrangência dos efeitos do stay period […]

Na verdade, a Lei de Recuperação Judicial não alcançou as supervenientes e transitórias necessidades do mercado, deixando lacunas que possibilitam a adoção de medidas criativas por parte dos juristas. Bem por isso, que existem algumas propostas de Lei em tramitação no Congresso Nacional com o escopo de atualizá-la às necessidades atuais.

Por conta disso, visando atender os anseios das empresas em dificuldade econômica, e com baixa liquidez a curto e longo prazo, é necessário que a leitura da letra da Lei possa se dar com base no atual cenário econômico, e que medidas urgentes possam ser tomadas para o fim de resguardar a possibilidade de permanência das atividades da empresa, possibilitando a circulação de bens, serviços ou produtos, a continuidade na arrecadação de produtos que possibilita a continuidade dos serviços públicos, e ainda a manutenção de postos de trabalho e renda.

Em outras palavras, deve-se ter sempre em mente o precípuo objetivo do instituto da recuperação judicial, preconizado pelo art. 47 da Lei 11.101/ 2005: “viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do em prego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.”

Com base nestas considerações, levando-se em conta que o fechamento de empresas possa causar diminuição de receitas fiscais, extinção de emprego e queda no desenvolvimento econômico da região, o pedido de tutela de urgência antecedente pode ser a resposta para garantir a manutenção das atividades econômicas e a execução da sua função social.

 

*Por Dra. Maridiane Fabris (OAB/SC 45.283), advogada associada. 

 

 

 

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