Tem sido muito comum a utilização de cessão de contrato em meio ao direito imobiliário e, em razão disso, questões envolvendo a anuência da incorporadora ou construtora são objeto de inúmeras discussões.
Como se sabe, na cessão do contrato, o cessionário assume a posição que originariamente pertencia ao cedente, com o consentimento do cedido, permanecendo inalterado o conteúdo jurídico do pacto. E, para possibilitar a cessão é fundamental que o contrato seja bilateral, acarretando direitos e obrigações recíprocas e, ainda, que haja o consentimento do cedido, conforme dispõe o artigo 299 do Código Civil, para que o cedente libere-se, sendo substituído em sua posição pelo cessionário, até mesmo porque, assegurar ao credor o direito de não ver substituído o devedor sem sua concordância é princípio fundamental no direito das obrigações*.
Nesse sentido, inclusive, colaciona-se recente decisão do TJSP:
Apelação. Compromisso de compra e venda. Ação de cobrança das parcelas do preço promovida pelo promitente-vendedor. Alegação de ilegitimidade passiva dos compromissários-compradores em razão da cessão do contrato a terceiro. Não acolhimento. Inexistência de anuência da vendedora no negócio, tornando-o inoponível. Necessidade de concordância do credor para cessão de posição contratual, tal como disposto no art. 299 do Código Civil, regra aplicável tanto à assunção de dívida quanto à cessão de posição contratual. Recurso desprovido. (TJSP; Apelação Cível 1001729-54.2019.8.26.0624; Relator (a): Enéas Costa Garcia; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro de Tatuí – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 30/03/2021; Data de Registro: 30/03/2021) – [grifo nosso].
Pode dizer que, depois de perfectibilizada uma relação contratual, somente pode haver alteração em seus termos mediante o consenso de todos os pactuantes, sob pena de violação ao princípio da intangibilidade dos contratos, pois ninguém é obrigado a contratar senão de acordo com os seus interesses e a própria manifestação de vontade.
Portanto, plenamente válida a cláusula que exige anuência da construtora/incorporadora para cessão do contrato a terceiros. E, caso seja celebrado um contrato de cessão de direitos versando sobre imóvel objeto de promessa de compra e venda, sem a anuência da incorporadora/construtora, que figura como proprietária no registro de imóveis, a cessão será considerada ineficaz em relação a essa.
*Por Dra. Kariny Zanella Demessiano (OAB/SC nº 47.974), advogada associada.
* ROSENVALD, Nelson; FARIAS, Cristiano Chaves de. Curso de Direito Civil: obrigações. 10 ed. Salvador: Ed. Jutpodivm, 2016. v. 2. p. 388 e pp. 390-391.